Jovem voluntário, escola solidária

06/03/2002
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Minha escola não é uma instituição destinada a formar, apenas, profissionais qualificados para o mercado de trabalho. Em seus pressupostos éticos e em sua metodologia pedagógica, procura formar cidadãos, e não consumidores; homens e mulheres altruístas, e não egocêntricos; pessoas abertas ao contexto social em que vivem, e não voltadas ao próprio umbigo. A transmissão do patrimônio cultural está indissociavelmente vinculada à formação do caráter, segundo valores que nem sempre coincidem com os que regem a ideologia da competitividade a qualquer preço. Adota-se o primado da solidariedade. É uma escola cujos alunos editam um jornal; conhecem a vida familiar dos funcionários e procuram ajudá-los, como no reforço escolar de seus filhos; asseguram, em cada classe, uma bolsa-escola a um jovem empobrecido, graças a recursos de suas próprias famílias. Minha escola é um centro conectado à comunidade circundante, de modo a reduzir a distância entre texto e contexto, saber e compromisso social, e introduz no currículo, como tema transversal, a cultura e a prática do voluntariado. É, portanto, uma Escola Solidária, que participa de campanhas de combate à fome, à aids, ao dengue etc. No inverno, recolhe agasalhos e os distribui aos desabrigados e, na época do Natal, coleta tudo aquilo que muitas pessoas guardam em casa sem fazer uso e, graças à venda daqueles produtos a preços módicos, ajuda o centro comunitário do bairro. Não se restringe, porém, ao mero assistencialismo. Debate, entre professores, alunos, pais e funcionários, as causas dos problemas sociais; convida políticos de diferentes partidos para palestras; forma a consciência crítica; mantém contato com movimentos populares e ONGs vinculados ao excluídos; conhece as conexões que unem a conjuntura nacional à internacional. Organiza eventos ecumênicos com representantes de todas as denominações religiosas, favorecendo aos alunos uma boa formação quanto às espiritualidades vivenciadas pelo povo brasileiro. Voltada à formação de cidadãos conscientes e participativos, a Escola Solidária empenha-se, a começar pelas populações empobrecidas que lhe são vizinhas, na alfabetização de adultos; incentiva os alunos a ler para idosos e enfermos, em asilos e hospitais; promove jogos e atividades esportivas com crianças carentes; oferece à comunidade serviços como horta e farmácia comunitárias; primeiros socorros; educação sexual etc. É também uma Ecoescola Solidária, que ensina a preservar o meio ambiente, reciclar o lixo, economizar água e energia, promovendo excursões e campanhas contra todas as formas de poluição, da tóxica à sonora. Cada um de nossos alunos adotou uma árvore do bairro, mantendo-a sob cuidados e vigilância. Ela jamais fica fechada um período do dia e, nos fins de semana, abre suas instalações para festas cívicas e religiosas; eventos comemorativos; gincanas educativas; atividades esportivas; cursos de formação para a cidadania; oficinas semi-profissionalizantes, como costura, culinária, chaveiro, bombeiro, cabeleireiro, manicure, massagens terapêuticas, fitoterapia etc. Forma os estudantes para situações de emergência, estabelecendo parcerias com instituições como a Defesa Civil, de modo a torná-los aptos a prestar ações solidárias em caso de enchentes, incêndios, seca prolongada, endemias (dengue) etc. Nas férias e nos feriados, promove visitas de estudantes e professores a áreas carentes do município (favelas) e do país (Vale do Jequitinhonha, semi-árido do Nordeste, assentamentos agrícolas etc), desenvolvendo ali mutirões voluntários de educação para a cidadania, através de filmes, apresentações teatrais, vídeos, minicursos de primeiros socorros, higiene no lar, saúde, hábitos alimentares, direitos do consumidor, da criança e do adolescente etc. Onde fica essa escola que suscita, no jovens, iniciativas altruístas e voluntárias? Ora, por enquanto, tem endereço em minhas utopias pedagógicas. Mas tudo indica que se transformará em realidade, pois no próximo dia 15 de março, às 10h, a ONG Faça Parte, monitorada por Milú Villela, fará o lançamento, na Assembléia Legislativa de São Paulo, do projeto Jovem Voluntário, Escola Solidária. * Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Paulo Freire e Ricardo Kotscho, de "Essa Escola chamada Vida" (Ática), entre outros livros.
https://www.alainet.org/es/node/105676
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